Não importa o quanto se lê agora, mas como se lê

Por , 25 de February de 2016 a las 07:00
Não importa o quanto se lê agora, mas como se lê
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Não importa o quanto se lê agora, mas como se lê

Por , 25 de February de 2016 a las 07:00

Uma das principais preocupações que a sociedade digital traz é se, por causa das telas, as pessoas estão deixando de ler. As pesquisas, em princípio, não parecem confirmar este particular. No entanto, se espalha a ideia de que grande parte da população está se afastando de leitura, especialmente os mais jovens.

A publicação Hacia una antropología de los lectores (Rumo a uma antropologia de leitores, disponível para download gratuito), dirigida por Néstor García Canclini e editada pela Fundación Telefónica México, analisou as mudanças nos hábitos de leitura no país, que em muitos casos podem ser extrapolados para outras regiões da América e da Europa.

O ponto de partida deste estudo foi o de mudar a pergunta sobre o quanto lemos para quando e como lemos. A visão que enfrenta a leitura e a tecnologia audiovisual, comumente aceita, vem sendo questionada há vários anos nos estudos da cultura e da comunicação.

Os autores do livro falam de um processo de recomposição da cultura em todo o mundo: “A Convergência Digital está trazendo uma integração multimídia que permite ver e ouvir no telefone celular, áudio, imagens, textos escritos e transmissão de dados. Nem os hábitos atuais de leitores-espectadores-internautas, nem a fusão de empresas que antes produziam separadamente cada tipo de mensagem, permitem pensar como ilhas separadas os textos, as imagens e sua digitalização”.

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Talvez na sociedade digital não tenha já sentido medir a leitura pelo número de livros ou revistas lidas em um período de tempo, mas pela capacidade de gerenciamento dos recursos de informação, ou em outras palavras, a competência leitora. Fala-se de “exercer a competência leitora” como da aquisição de competências para localizar, selecionar e interpretar informações. Estas são as competências exigidas pelas profissões melhor qualificadas e, neste sentido, concebe-se a exclusão digital não só como falta de acesso ao mundo das redes digitais, mas pela incapacidade de integrar, avaliar e comunicar informação.

Neste sentido, Hacia una antropología de los lectores associa a suposta “crise da leitura” com os novos fins adquiridos pela leitura: “os estudantes de carreiras técnicas ou superiores, executivos e líderes políticos não são “leitores” no sentido moderno”. Nas palavras de Anne Marie Chartier, “sabem ler e escrever muito bem, porque trabalham o dia todo com telas e teclados, mas fazem pouco caso dos erros ortográficos, se expressam com um jargão profissional compreensível apenas para os iniciados, leem poucos jornais, não compram romances excetuando os policiais, leem revistas em quadrinho, revistas de esportes, mas não leem literatura”.

Por outro lado, muitas profissões, como advogados, engenheiros, técnicos, comerciantes, políticos e jornalistas, fazem uso constante da escrita para executar as tarefas que têm que realizar, mas muitas vezes não voltam aos livros, anuários e revistas, mas outras formas alternativas de apresentação do conhecimento, como o Google, o Google Earth, apps, programas baseados na tecnologia 3D… Os canais tradicionais de informação são amplamente substituídos por outros relacionados aos formatos digitais e das redes.

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Estas novas vias de informação exigem mais conhecimento do que apenas ler e escrever: deve-se saber navegar no hipertexto digital (“usar ícones de navegação, barras de rolagem, abas, menus, links, funções, dedicar tempo para se conectar com fotos, música e mapas dos sites”) e adotar um posicionamento ativo contra a passividade implícita no texto tradicional. A principal característica do ambiente digital é a interatividade: o usuário torna-se, simultaneamente, consumidor e produtor de informação ao enviar e-mails, escrever posts ou comentários em blogs, opinar em redes sociais e avaliar conteúdos alheios… “O leitor torna-se autor, o consumidor produz”, afirma Nestor Garcia Canclini.

Neste contexto, devemos procurar novas maneiras de avaliar os leitores, além dos indicadores clássicos baseados em horas de leitura e no número de livros lidos. Não se trata de levar a análise tradicional da letra impressa para o ambiente digital e começar a medir e-books e bibliotecas eletrônicas. Compreender os novos fenômenos emergentes na sociedade digital sobre a competência leitora e gestão de informação requer, entre outras coisas, estudar as conversas que acontecem nas redes sociais, as formas de compartilhamento de conhecimento baseadas em vídeo, a interação via YouTube, os downloads de textos, a micropoesia no Twitter e, em conjunto, todos os comportamentos do usuário da web 2.0, especialmente os jovens, que constituem a falange na vanguarda da mudança.

Os autores do livro nos deixam uma nota otimista, a cultura não desaparece, mas se transforma:

“Há vida para a leitura fora das bibliotecas e livrarias. Há vida para as bibliotecas, livrarias e editoras se se reinventarem como editores, no sentido de organizadores de textos e outros recursos de conhecimento e de entretenimento de acordo com o estágio do desenvolvimento sócio-cultural e tecnológico”.

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